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A globalização trará justiça na distribuição de recursos no Mundo.

Este foi o argumento de sustentação da globalização. Em teoria, academicamente, nada a opor. O incremento (liberdade) das trocas comerciais entre os vários países e zonas do Mundo  deverão conduzir aquele objectivo.

Muitos países, ainda dispõem de mão-de-obra barata. Dessa forma, conseguem produzir a preços atractivos, atraindo as multinacionais (e não só), o Trabalho e a correspondente riqueza. Mesmo que esta seja apenas uma expectativa ou para usufruto futuro...

Outros paises, mais ricos, acedem a produtos e serviços a (baixos) custos impensáveis, caso a produção fosse local.

Parece bom para todos. E é, numa primeira fase.

A globalização vive à custa de desigualdades. De custos do trabalho e rendimentos distintos. De diferenças de “aquecimento” económico entre países, entre zonas (nos maiores países) ou ainda, entre grupos populacionais dentro da sociedade. Neste último caso, criando discriminações sociais mais ou menos evidentes, mais ou menos lícitas, mais ou menos aceitáveis. Nos países mais ricos, direccionando recursos humanos (emigrantes) para as tarefas mais básicas e mais mal pagas da sociedade (os locais recusam essas tarefas com base na formação adquirida e em sistemas de protecção social e desemprego remunerado que lhes permite fazer isso).

Essas diferenças de "aquecimento económico" são determinantes para a criação de fluxos de capitais, trabalho, indústrias, matérias-primas, produtos e serviços entre esses pólos de desenvolvimento de “temperatura” distinta. Que procuram sempre os melhores locais, custos de produção inferiores, benefícios fiscais e proximidade das zonas de origem da matéria prima.

No final do processo, a longo prazo, esses fluxos tenderão para equilíbrios. Pelo que os impactos e os dinamismos da globalização diminuirão à medida que aqueles forem sendo atingidos.

Até lá, continuaremos a assistir a crescimentos significativos em alguns países em desenvolvimento (China, Índia, Brasil) por força da globalização (abertura e crescimento de novos mercados de produção e consumo) e noutros, à base da riqueza trazida pelos recursos naturais que dispõem (Noruega, Venezuela, Angola).

Mas, nos países desenvolvidos, que não possuírem esses recursos naturais, o processo será inverso.

A globalização disponibiliza-lhes produtos baratos, elevando a sua qualidade de vida da sua população. Mas, como vimos, a face oposta da moeda é o contínuo desaparecimento do trabalho, que se deslocaliza irremediavelmente para os países que produzem esses bens. Para onde vai grande parte do rendimento, do capital liberto. Logo, vão com estes, as unidades produtivas, o trabalho e o emprego. A médio prazo, instala-se um processo de redução gradual, mas invertível, da riqueza disponível.

Um processo que conduzirá à rotura social ou a uma Nova Sociedade.

Não se pense que haverá países desenvolvidos imunes a este “recuo”. Simplesmente uns cairão mais fundo e/ou mais rapidamente que outros. Em função das matérias-primas e energia que possam ter disponíveis (suas e outras, externas, acessíveis das mais váriadas formas, tais como através da sua capacidade financeira, militar ou outras), da gestão da mudança que consigam empreender e do trabalho e consolidação que façam ao nível das estruturas produtivas locais.

Como vimos atrás, o trabalho será a base de toda a riqueza e da qualidade de vida das populações na Nova Sociedade.

Na Nova Sociedade, nos países desenvolvidos, a “recessão” será um estado normal das economias e deixará de ter o peso negativo actual. Pois como será fácil reconhecer, as populações destes países vivem bem acima dos níveis de sustentatibilidade global e local.

Esta mudança já começou. Não nos iludamos com crescimentos pontuais na ressaca de quedas anteriores. Ou ainda com situações extraordinárias resultantes de financiamentos externos (resultantes de opções próprias ou de decisões do mercado à procura de locais mais estaveis e de salvaguarda para os seus capitais). A mudança já começou e, nos países desenvolvidos o processo é descendente.

Todos procuram adivinhar se a crise actual terá um processo de recuperação em V ou em U, ou se será W ou qualquer outra letra cuja representação gráfica termine, convenientemente, “em cima”…

Ora, não será assim, nestas economias. A letra provável será um L. O que variará em cada pais será a inclinação das duas linhas do referido L. Ou se cai muito e rápido ou pouco e de forma lenta e controlada. A linha de base até poderá assumir uma direcção em crescendo. Mas nunca atingirá os níveis iniciais que traduzem a situação dos últimos anos.

Muitos economistas, da velha guarda, definem a mudança em curso como uma alteração de paradigma que transforma as relações entre países de um WIN-LOSE de resto zero para um WIN-WIN onde todos ganham. Essa seria uma mudança desejável, só que não passa de um desejo. Infelizmente, o futuro não se apresentará de nenhuma destas formas. Será sim um WIN-LOSE de resto negativo (quem perde, perde sempre mais do que ganha o outro). Isto porque o Planeta tem suportado até onde pode as exigências da humanidade nos últimos anos e já não aguenta mais. A energia disponível cairá significativamente, num período algo demorado, entre o fim da disponibilidade ilimitada e barata dos combustíveis fósseis e o advento de uma nova tecnologia substituta.

A crise actual é apenas o início do processo de ajuste que se segue. Os países em desenvolvimento e os que têm energia e matérias primas próprias ou ao dispor não sentirão crise alguma. Os primeiros porque partem de baixo e são atractivos para o capital que quer produzir a partir de economias que lhes garantem trabalho a baixo custo. Os segundos porque vivem sobre jazigos valiosos. Esta crise consiste apenas no início do Futuro. A recessão passará a ser um estádio normal, a gerir o melhor possível. O sucesso passará a se traduzir na melhor ou pior gestão da "descida".

A queda dos países desenvolvidos será tanto maior quanto mais adiarem a mudança para a Nova Sociedade. Se a queda passa a rotura, os problemas poderão ser enormes.

* A mudança na Economia

A mudança passa pela imediata reversão da desertificação (local) de muitas actividades económicas, provocada, nos últimos decénios, pelo comércio global que trouxe para os mercados locais produtos vindos do exterior a preços extremamente agressivos, por não terem incorporados, no seu preço, os custos sociais de quem os produziu e por se basearem em trabalho de baixa retribuição.

Esta inversão é fundamental para assegurar a revitalização (local) dos sectores económicos básicos e estruturantes.

No Velho Continente, a Comunidade Europeia tem enfermado neste erro, “afundando” as actividades básicas nas economias locais e regionais, através do financiamento directo da sua eliminação e do policiamento aguerrido na garantia da salvaguarda da concorrência inter-comunitária, impedindo políticas locais e regionais de incentivo às actividades que assegurariam a sustentabilidade daqueles sectores, comprometendo seriamente o futuro.

Na Nova Sociedade, a ocupação da população terá determinadas características:

1)Trabalho produtivo
            Em actividades básicas, locais e estruturantes
            Na área dos produtos e serviços transaccionáveis
            Na área dos serviços locais e lazer

2)Não trabalhador (estudante, reformado, desempregado, beneficiário).

3)Trabalho não produtivo (a eliminar, gradualmente através de reestruturações sociais).

4)Emprego inútil (a eliminar imediatamente).

* Sector económico básico, local e estruturante

Este sector incluirá toda a estrutura económica de base.

Juntará todas as actividades relacionadas com a produção alimentar e a energia criada localmente. Acrescem os respectivos serviços conexos (gestão, operacionalização, distribuição e segurança. Juntam-se as comunicações e os serviços básicos de saúde e educação.

Academicamente, para se apurar quais as actividades que devem ser situadas neste sector, executa-se um exercício simples: caso a localidade (zona geográfica em questão) fique isolada do resto do Mundo, estas actividades não deverão ser colocadas em causa a fim de ficar assegurada, embora de modo totalmente distinto do usual, a sobrevivência da sociedade em questão. 

Pelo que se junta o planeamento, a preparação e o treino de protecção civil complementar onde cada elemento da população terá um papel pré-definido. Onde quem trabalha - nestas actividades - continuará a fazê-lo, mas recebe “reforços” da população que virá dos outros sectores de actividade, inúteis numa situação de emergência. 

Outro papel fundamental é a segurança, onde as forças militares e policiais assumirão o controlo. Também reforçado por outros, vindos da sociedade civil. Uma espécie de “reserva civil” (Israel tem um modelo destes, por outras razões e para outros efeitos) que deverá incluir uma semana anual de preparação e treino. Neste plano deverão ser previstos e preparadas as situações de alojamento e reafectação de actividades das populações urbanas que apenas sobreviviriam -neste modelo académico-  junto às zonas onde se produziriam os alimentos.

As estruturas deste sector passarão a ser geridas de uma forma independente do exterior e das relações comerciais globais. Terão de estar totalmente protegidas das regras da concorrência (que as eliminariam) a fim de garantir - localmente - um determinado nível de produção e a salvaguarda da manutenção do conhecimento sobre o que fazer e como produzir.

* Sector de produção de bens e serviços transaccionáveis

Neste sector, juntam-se a extracção de matérias-primas e as indústrias apontadas para a exportação (incluindo o Turismo). Todas elas criadoras de bens e/ou serviços transaccionáveis, fundamentais para a criação de riqueza e bem-estar da sociedade produtora.

Constituirão a contribuição da região para a economia global e a sua “moeda de troca” no acesso a outros bens e serviços produzidos externamente. Quanto mais se vende, mais se poderá comprar. Inclui-se, aqui, a Indústria e o Turismo; e os serviços de Saúde e Educação de nível médio.

* Sector de Serviços especializados locais e de lazer

Neste último sector incluem-se outras actividades (principalmente serviços) de valor acrescentado, que, existindo e estando acessíveis potenciam a qualidade de vida local e a atractividade nas zonas turísticas.

* Ideias básicas

Um País ou Região, grande ou pequena, terá que salvaguardar a sua existência, na Nova Sociedade, através de uma atenção acrescida na valorização do sector básico da sua economia. Que constituirá a sua estrutura, o trampolim, o seguro de vida, o garante de tudo o que, a partir daí, poderá fazer e produzir nos sectores de nível superior superiores.

Não haverá solução, nem futuro, nos casos em que o novo processo económico não se construa de baixo para cima. Uma sociedade que perca o sector básico ficará totalmente refém do exterior. Perderá a sua autonomia. Sofrerá em cada situação em que a economia global se “constipe”. E isso acontecerá repetitivamente e cada vez mais, à medida que o aquecimento global se vai incrementando e originando mais catástrofes naturais, que a energia rareie e não chegue a determinadas zonas.

Como já se referiu, uma parte significativa da população não “caberá” nas actividades disponíveis - não terá trabalho - nesta nova organização social. Muitos viverão sem ele e com um rendimento mínimo. Que será garantido, mas não fixo. Dependerá ou será directamente proporcional à riqueza produzida - efectivamente - pela Sociedade no seu todo. Que se libertará para este efeitos, por razões solidárias, mas também - e perdendo algum cinismo - por razões de estabilidade (e não de igualdade) social.

Nessa altura, na Nova Sociedade, as actividades produtivas contarão com os mais capazes e com os recursos necessários e essenciais, sem quaisquer “gorduras” desnecessárias. As Elites serão determinantes neste processo. As pessoas certas nas tarefas certas. Para bem da sociedade no seu todo, os mais capazes devem ocupar os (cada vez menos) lugares disponíveis.

Assim, maximizando a produção, todos acederão a uma parte da riqueza conseguida. Por via do referido novo modelo de Suporte Social.

Infelizmente, os procedimentos preventivos de sobrevivência de um País ou Região - por si só - num caso se emergência global, de nada serve se todas as outras zonas (vizinhas) não fizerem o mesmo… 

Pois aí, a população da zona desestruturada logo cairá em cima da zona onde a situação estava prevenida. E aí, será mau para todos. Uma Ordem Global será sempre necessária para garantir que todos ou determinado grupo de paises cumprem o seu "trabalho de casa" nestas matérias e que, em conjunto, se salvaguardem de outros países, vizinhos, que não o façam. A NATO evoluirá para assegurar um papel deste nível.

Temos vários exemplos de “constipações” sócio-económicas que originam problemas. Para já, não passaram de resfriados leves:

A Gripe A foi uma boa “vacina”, na preparação de algo do tipo que aí venha, mas mesmo a sério.
Uma qualquer greve em refinarias ou transportes, cria logo uma situação de enorme transtorno (talvez rotura) na distribuição de inúmeros produtos, muitos deles essenciais, em muitos locais.
Uma catástrofe natural ... numa zona de produção intensiva de trigo,milho ou arroz determina, de imediato, um aumento de preços e a escassez nas zonas mais desfavorecidas...
Um acidente grave (central atómica)...
Uma guerra…
Uma acção terrorista de sucesso em qualquer local determinante…

Como vimos, a Nova Sociedade promoverá o isolamento regional do sector básico em relação ao exterior (isentando-o das regras de concorrência global), revertendo os erros cometidos nos últimos decénios, criando zonas que deixaram de ter qualquer capacidade de se auto-sustentarem em termos alimentares e energéticos.

A actual política, de especialização global (isola-se toda a produção nas zonas mais apropriadas para o efeito) é compreensível e até ideal em termos teóricos. Produziria quem possuísse melhores condições para tal. Mas esta opção "tropeça" quando ocorre uma qualquer “constipação” na economia. Que pode colocar uma sociedade em rotura, em pouco tempo.

Em grandes metrópoles, o problema poderá ser gigantesco. O plano de “protecção civil” obrigará a enormes movimentações e adaptações. O regresso aos campos poderá ser necessário e terá se ser feito controladamente, sendo necessário estar preparado para isso.

A Globalização trará justiça na distribuição de recursos no Mundo. Mas não poderá actuar transversalmente, em todos os sectores económicos, sem excepção. A Nova Sociedade definirá as suas fronteiras de actuação. Para que “os eucaliptos não tomem conta da floresta”.

* Conclusão

O Sector Básico assegurará a produção estrutural de cada local. Alimentação e energia. A intervenção - dinamizadora - dos poderes públicos locais neste sector será livre, isento do cumprimento das actuais regras da concorrência global. 

O Sector de Bens e Serviços Transaccionáveis assegurará a produção de bens e serviços vendáveis ao exterior. Serão tanto mais "rentáveis" quanto produzidos a partir de recursos locais. Esta "venda ao exterior" é que capacitará o acesso da sociedade a (outros) produtos globais, não produzidos localmente. Apenas vendendo o que produzimos poderemos comprar o que queremos consumir.

O Sector de Bens e Serviços Especializados e de Lazer vai garantir a ocupação de uma grande parte da população. Este sector dependerá e será tanto maior quanto maior for a "cama" criada pelos outros dois sectores. Que não poderão deixar de ser constantemente monotorizados e consolidados. A ideia de que este sector (terciário) pode vingar sem aquela "cama" é totalmente ilusória.

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